"Tem de meter a colher, sim"", diz autora de livro sobre feminicídio

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“O menino foi buscado em Estância por uma assistente social, acompanhada de um oficial de Justiça, na semana seguinte ao enterro da mãe. Antes de ele ser entregue a Gercina, o juiz conversou com Eduardo e, atônito, ouviu a seguinte descrição sobre o que acontecera com a mãe: ‘Ele amarrou ela na cadeira. Bateu com o pau na cabeça dela, e ela caiu no chão, chorando... Aí, ele botou álco e fez tuft! Ela foi pra rua gritando muito... Jogaram areia e água nela...’” A cena de pirotecnia macabra engendrada pelo cabo do Corpo de Bombeiros causou asco e revolta na opinião pública pernambucana. Passaria despercebida, entretanto, não fosse o despudor da mãe em escancarar sua dor em todos os fóruns que se lhe apresentaram e exigir justiça. Casos semelhantes acontecem às dúzias, cotidianamente, do Oiapoque ao Chuí, numa trivialidade que anestesia, quando deveria chocar e gerar atitudes. A violência doméstica, tendo a mulher como alvo, é um câncer na sociedade. Embora normalmente se torne notícia nas páginas policiais, morre em si mesma, a menos que se trate de gente bem-posta na vida, o que não se aplica à família de Mônica. Gercina, todavia, conseguiu manter o assunto em pauta meses, anos a fio, e sua obstinação, a despeito de tudo, fez a diferença.” 

A dor de uma criança bem pequena contando detalhes da morte da própria mãe ao juiz dói também no coração do leitor ao imaginar cena tão triste. A tragédia da família do pequeno Eduardo por trás desse momento macabro é contada pela jornalista e escritora Sulamita Esteliam. Ela  se debruçou sobre autos do processo criminal, vídeos do julgamento, depoimentos e entrevistas e informações em diversas instituições para esmiuçar um caso emblemático que teve grande repercussão nos anos 1990, em Pernambuco

O resultado é o livro-reportagem Em nome da filha, obra vigorosa e contundente, que chega agora ao mercado como denúncia e alerta contra a violência doméstica, que mata mulheres e destrói famílias, tendo como base a história de Mônica Francisca da Silva Lima, a jovem de 20 anos assassinada após anos de ameaças e agressões do companheiro, o cabo do Corpo de Bombeiros Carlos Antônio de Assis Callou.

“Confesso que sofri para escrever este livro. Foi uma longa jornada: cinco anos de investigação de busca de elementos, inspiração e alguma imaginação para preencher as lacunas dos relatos e documentos”, conta Sulamita.

A paixão desenfreada de Mônica e Callou começou quando ela mal tinha entrado na adolescência e perdurou por sete anos, entre idas e vindas, até o triste desfecho. E a pergunta é inevitável: por que, diante das evidências e das ações agressivas de Callou, Mônica não o abandonava? “Que estranho poder é esse?”, indaga Sulamita na obra.

Além da paixão, o medo segurava Mônica, que chegou a denunciar Callou em delegacias, fugiu dele, se casou, mas largava o marido e sempre voltava para ele ou era ‘raptada’ de novo pelo amante ao mesmo tempo sedutor e agressivo.

"Este livro quer ser um chamado para que a sociedade não se omita. Sim, falo de meter a colher para evitar tragédias anunciadas".

Em nome da filha / Sulamita Esteliam (Editora Viseu) R$ 32,90.

 

 

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